quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Meus Reflexos no Espelho Mágico de Quintana

Espelho Mágico – Mário Quintana
Meus Reflexos
Da Observação
Não te irrites, por mais que te fizerem...
Estuda, a frio, o coração alheio.
Farás, assim, do mal que eles te querem,
Teu mais amável e sutil recreio.

Não se irrite
porque você vai ficar
só com rinite.
Do Estilo
Fere de leve a frase... E esquece... Nada
      Convém que se repita...
Só em linguagem amorosa agrada
A mesma coisa cem mil vezes dita.

Mil vezes dita
palavra em que você
nem acredita.
Das Belas Frases
Frases felizes... Frases encantadas...
      Ó festa dos ouvidos!
Sempre há tolices muito bem ornadas...
      Como há pacóvios bem vestidos.

Frases felizes
não conseguem resolver
tantos deslizes.
Do Cuidado da Forma
      Teu verso, barro vil,
No teu casto retiro, amolga, enrija, pule...
Vê depois como brilha, entre os mais, o imbecil,
      Arredondado e liso como um bule!

Vê como brilha
areia branca no sol
daquela ilha.
Dos Mundos
Deus criou este mundo. O Homem, todavia,
Entrou a desconfiar, cogitabundo...
Decerto não gostou lá muito do que via...
E foi logo inventando o outro mundo.

Deus no mundo
surgiu da mente de um
meditabundo.
Das Corcundas
As costas de Polichinelo arrasas
Só porque fogem das comuns medidas?
Olha! Quem sabe não serão as asas
De um Anjo, sob as vestes escondidas...

Serão as asas
da imaginação as
ardentes brasas?
Das Utopias
Se as coisas são inatingíveis... ora!
Não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos, se não fora
A presença distante das estrelas!

Inatingíveis
os múltiplos orgasmos
viram risíveis.
Dos Milagres
O milagre não é dar vida ao corpo extinto,
Ou luz ao cego, ou eloquência ao mudo...
Nem mudar água pura em vinho tinto...
Milagre é acreditarem nisso tudo!

Com vinho tinto
tristeza se torna um
corpo extinto.


Das Ilusões
Meu saco de ilusões, bem cheio tive-o.
Com ele ia subindo a ladeira da vida.
E, no entretanto, após cada ilusão perdida...
Que extraordinária sensação de alívio!

Cada ilusão
perdida me deixa de
mal com a vida.
Dos Nosso Males
A nós nos bastem nossos próprios ais,
Que a ninguém sua cruz é pequenina.
Por pior que seja a situação da China,
Os nossos calos doem muito mais...

Pequenina
dor de cabeça me deu
ninfa menina.
Da Eterna Procura
Só o desejo inquieto, que não passa,
Faz o encanto da coisa desejada...
E terminamos desdenhando a caça
Pela doida aventura da caçada.

Doido desejo
sacou o passarinho
do realejo.
Do Pranto
Não tente consolar o desgraçado
Que chora amargamente a sorte má.
Se o tirares por fim do seu estado,
Que outra consolação lhe restará?

Tanto pranto
jorrando por causa de
um desencanto?
Do Sabor das Coisas
Por mais raro que seja, ou mais antigo,
Só um vinho é deveras excelente:
Aquele que tu bebes calmamente
Com o teu mais velho e silencioso amigo...

Raro que seja,
meu anseio por você
dá brotoeja.
Dos sistemas
Já trazes, ao nascer, tua filosofia.
As razões? Essas vêm posteriormente,
Tal como escolhes, na chapelaria,
      A forma que mais te assente...

Filosofia
na chapelaria já
não mais faria.
Do Exercício da Filosofia
Como o burrico mourejando à nora,
A mente humana sempre as mesmas voltas dá...
Tolice alguma nos ocorrerá
Que não a tenha dito um sábio grego outrora...

Sabe o grego:
na pós-modernidade
perdeu emprego.
Das Ideias
      Qualquer ideia que te agrade,
      Por isso mesmo... é tua.
O autor nada mais fez que vestir a verdade
Que dentro em ti se achava inteiramente nua...

Nada mais verdade
que qualquer pensamento
que lhe agrade.
Da Amizade entre Mulheres
Dizem-se amigas... Beijam-se... Mas qual!
      Haverá quem nisso creia?
Salvo se uma das duas, por sinal,
      For muito velha, ou muito feia...

Amigas se beijam
enquanto pelas costas
farpas lampejam.
Da Felicidade
Quantas vezes a gente, em busca da ventura,
Procede tal e qual o avozinho infeliz:
Em vão, por toda parte, os óculos procura,
      Tendo-os na ponta do nariz!

Ponta do nariz
segura os óculos
da imperatriz.
Da Realidade
O sumo bem só  no ideal perdura...
Ah! Quanta vez a vida nos revela
Que “a saudade da amada criatura”
É bem melhor do que a presença dela...

Sofrendo sem fim,
saudades da amada,
foi feliz com Quim.
Do Amoroso Esquecimento
Eu, agora – que desfecho!
Já nem penso mais em ti...
Mas será que nunca deixo
De lembrar que te esqueci?

Penso mais em ti
ouvindo músicas do
Quarteto em Si.
Da Discrição
Não te abras com teu amigo
Que ele um outro amigo tem.
E o amigo de teu amigo
Possui amigos também...

Se teu amigo
tem amigos, segrede
pro teu umbigo.
Da Preguiça
Suave Preguiça, que do mau-querer
E de tolices mil ao abrigo nos pões...
Por causa tua, quantas más ações
      Deixei de cometer!

Ai que preguiça!
Fernando não cansa de
encher linguiça!
Do Ovo de Colombo
Nos acontecimentos, sim, é que há Destino:
Nos homens, não – espuma de um segundo...
Se Colombo morresse em pequenino,
O Neves descobria o Novo Mundo!

Deu tudo certo
porque Colombo teve
ovo por perto.
Do Mal da Velhice
Chega a velhice um dia... E a gente ainda pensa
Que vive... E adora mais a vida!
Como o enfermo que em vez de dar combate à doença
Busca torna-la ainda mais comprida...

Longa velhice,
além das rugas causa
também calvície.
Da Moderação
      Cuidado! Muito cuidado...
Mesmo no bom caminho urge medida e jeito.
Pois ninguém se parece tanto a um celerado
      Como um santo perfeito...

Nosso prefeito
finge tanto, parece
santo perfeito.
Da Calúnia
Sorri com tranquilidade
Quando alguém te calunia
Quem sabe o que não seria
Se ele dissesse a verdade...

Tranquilidade
para bem suportar
humanidade.
Da Experiência
A experiência de nada serve à gente.
É um médico tardio, distraído:
Põe-se a forjar receitas quando o doente
      Já está perdido...

Experiência
não é a mesma coisa
que sapiência.
De como Perdoar aos Inimigos
Perdoas... és cristão... bem o compreendo...
      E é mais cômodo, em suma.
Não desculpes, porém, coisa nenhuma,
Que eles bem sabem o que estão fazendo...

Bem compreendo,
mas sem perdão, nenhuma
coisa entendo!
Da Condição Humana
Se variam na casca, idêntico é o miolo,
Julguem-se embora de diversa trama:
Ninguém mais se parece a um verdadeiro tolo
Que o mais sutil dos sábios quando ama.

Um verdadeiro
tolo faz rir mesmo sem
um picadeiro.
Da Própria Obra
Exalça o Remendão seu trabalho de esteta...
Mestre Alfaiate gaba o seu corte ao freguês...
      Por que motivo só não pode o Poeta
      Elogiar o que fez?

Em poucos versos
vou descrevendo como
somos diversos.
Poemas de Mario Quintana extraídos de Quintana de Bolso: Rua dos Cataventos & Outros Poemas publicado pela L&PM Pocket, vol. 71, 2013.

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

O Palhaço

Apenas um lápis
o palhaço transforma
com muitas faces.

Sendo risonho
com traço diminuto
fica tristonho.

Com sobrancelha
triangular, um chinês
se assemelha.

Na branca face
uma pinta vermelha
é luz que nasce.

Sapato largo
com roupas coloridas
riso amargo.

Finge tristeza
falseando lágrima
nos dá beleza.

Com seu andor
você, Palhaço, espanta
toda nossa dor .

Com seu talento
fácil nos faz esquecer
o desalento.

Toda criança
sorri contente quando
pança balança.


quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Refletimentos

Refletimentos:
combinando reflexões
com sentimentos.

Iluminado
por estrelas, caminho
nessa jornada.

Poucas palavras
muito dizem quando o
poeta sente.

Sexto sentido
em um mundo virtual
lhe faz sensual.

Menina-moça
causa deslumbramento.
Perco fôlego.

Veio aos poucos
suavemente fincou
raízes fundas.

Jovem menino
tão belo que desperta
velho desejo.

Mente divaga
deitada no gramado
de forma vaga.

Mar revoltado
perto de meu coração
fica domado.

Havendo chance
abandono tristeza
em um só lance.

Entre imagens
em preto e branco sons
silenciosos.

Sei o que não quero
mas será que desejo
algo que não seio.
(após ler Décio Pignatari)

No desenlace
do plano de negócio
empresa nasce.

Tão enfadonho
surpreendentemente
me fez risonho.

Tanta mesmice!
Do tédio escapo com
são criancice.

Um gato pardo
tão alto no alto mia
com autonomia.

domingo, 4 de agosto de 2013

Casamento(s)

Para aqueles que já passaram por essa aventura humana

Para conviver
a dois, quase sempre, um
tem que se render.

Ao acordar
virar para o lado
na pele relar.

Horas distantes
no doce reencontro
feliz como antes.

Para solidão,
ela ou ele sempre
tem resolução.

Sobre relação
ela parece adorar
tanta discussão.

Homens de Marte,
mulheres de Vênus, só
com muita arte.

Do mesmo sexo,
ou de diferentes, vem
pequena morte.

De mãos dadas
na Praça da Espanha
dando risadas.

Se não durou,
no fim dói demais, mas
algo bom restou.

Seja como for
tudo vale a pena
por esse amor.